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LAST DANCE – COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 11/04/2010

Aqui se encerra uma experiência inovadora na imprensa e na vida dos homossexuais brasileiros. A Coluna GLS foi a primeira que mostrou que existia diferenças – saudáveis – entre lésbicas e bees e que cada um deveria ter seu ponto de vista. Foi aqui, que diferente de outras mídias – como a TV Globo onde o beijo gay é vetado -, que os homossexuais puderam abraçar suas causas. Pudemos aqui esboçar uma espécie de crítica à homofobia e uma auto-crítica a certos comportamentos viciados dos gays que só reforçam ainda mais o preconceito contra os homossexuais. Refletimos que é necessário romper barreiras, a feminilidade de um homem nem sempre corresponde à sua orientação sexual, como os chamados crossdressers (vestir-se do sexo oposto) que, em sua maioria, sentem desejo sexual por mulheres. A sexualidade humana é muito mais vasta do que a rotulamos.

Mas o mais notável – pelo fato da coluna estar inserida em um grande jornal – foi finalmente estarmos fora do gueto. Não escrever somente para gays, mas abrir o diálogo com os héteros foi a grande pulo do gato dessa coluna. Sem o apoio dos chamados “simpatizantes”, não conseguiremos avançar.

Depois de todos esses paetês (purpurina é coisa de desavisada!), não podemos nos esquecer que ainda somos sub-cidadãos, sem direitos civis. Por isso, queridinha, pegue seu sapatinho de rubi, porque ainda vamos caminhar muito pra chegar além do arco-íris. Mas chegaremos!

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 28/03/2010

Depois de explicar como se dá um pensamento autoritário contra as minorias e de apontar quem o está utilizando para reforçar antigas imagens – a TV Globo e os falsos simpatizantes – encerro essa saga do “crepúsculo” (de razões que a televisão desafina) refletindo sobre o que sobrará desse veneno de vamp que inundou o país nesses primeiros meses de 2010.

Com o Big Brother Brasil ficou claro a quantidade de mulheres misógenas que ainda não aprenderam que para um homem ser macho, ele não precisa ser machista. Também aflorou a homofobia de muitas bees, ao condenar que os gays participantes do programa não os representava (Gente, a única pessoa que me representa sou eu). Como também chocou muitos telespectadores que se indignaram com a atração de Serginho, um gay, por uma mulher, como se isso fosse algo ou do outro mundo ou impossível. Enfim, como diz o professor negro e antropólogo Kabengele Munanga: “O brasileiro nunca vai aceitar que é preconceituoso. Foi educado para não aceitar isso”. Nisso, o BBB foi um “avanço”.

Mas mesmo antes de terminar o reality, está óbvio que os grandes perdedores foram os direitos gays. Se há pouco tempo atrás, muitos diziam que não gostavam dos viados com certa vergonha e silêncio, hoje – em um retrocesso civilizatório – eles dizem com orgulho, batendo no peito. Por isso que falo que vivemos uma oposição à clásscia novela de Gilberto Braga. Se antes nos envergonhávamos de nossos atrasos e corrupções, hoje nos orgulhamos de nossos preconceitos. Será que realmente vale tudo – pelo Ibope?

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 14/03/2010

Nesses dias obscurantistas de Big Brother Brasil nasceu uma polarização entre os adoradores do personagem Dourado e os gays, que enxergam em sua mise-en-scène algo de nefasto para os homossexuais. Acredito que para além de Emilinhas versus Marlenes, devemos transcender essa caricatura criada pela edição do programa como se fosse realidade e perceber o imbroglio maior que essa questão nos coloca.

Ao tatuar em um dado momento o logo do programa, o lutador se funde simbolicamente com a corporação que “o apoia” – “A edição está fazendo a coisa certa” é um “douradofacts”. Aliás, realmente é muito espontâneo (NOT), característica elogiosa dos que idolatram Dourado, tatuar símbolos de empresas no corpo, mas ela denuncia o gaúcho como mero peão nesse xadrez de intolerância. Oras, não podemos esquecer que é exatamente nessa emissora que o beijo gay é sempre vetado. E é sempre bom lembrar que o Ministério Público investiga suposta responsabilidade de homofobia da Globo no reality.

Tentando escapar, a emissora do plim-plim diz em voz baixa a baixaria de não ser responsável pelas “declarações e opiniões pessoais de participantes de reality shows”.

Somando a essa covardia, temos também o silêncio ruidoso de muitos simpatizantes. Na cartilha das antigas revoluções dizia-se que o povo não tomaria o poder sem a ajuda de alguns burgueses. O mesmo acontece com os gays que não mudarão sua posição de sub-cidadãos sem a ajuda de héteros mais progressistas. Mas hoje percebemos que muitos deles eram simpatizantes pelo hype [dá um ar de modernidade ter um amigo viado, não?]. E dentro do fosso escuro que se encontram, abrem precedentes para discursos de ódio de outros que até então se envergonhavam de sua raiva para com os homossexuais.

Realmente , no paredão da idiotização, esses supostos simpatizantes e essa emissora “global” formam uma bela dupla – de extermínio.


Nosso verdadeiro Grande Irmão

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 28/02/2010

Nas formas mais totalitárias de poder sempre existe um grupo inimigo (seja ideológico, religioso, étnico ou sexual) para ser exterminado. Sob um discurso cheio de palavras de ordem, pensamentos distorcidos de forma perversa e vazios de lógica, esse grupo é construído para o resto da população como uma força maior do que a que possui e como a representação dos males de uma sociedade. Vivemos exatamente esse momento no microcosmo da realidade do país que é a sua televisão e mais especificamente o reality show “Big Brother Brasil”.

Quando os chamados coloridos entraram no programa, houve, para além de todas as tribos – idiotas – que foram formadas pelo Boninho, uma sensação geral que aquele era um grupo poderoso. Até a apresentadora “família” Angélica declarou que torcia pra drag. O vencedor, no inconsciente coletivo, era possível ser algum daqueles três homossexuais, representando a força gay e da diversidade. Ledo engado e construção barata que serviu exatamente para os propósitos contrários.

Na terça-feira, 23, foi televisionada mais um capítulo desse pensamento. No paredão, dois homossexuais, Angélica e Dicésar, e seu antagonista, Marcelo Dourado. Os gays – ou tribo dos coloridos – são exatamente esse grupo que construiram parecendo mais poderoso do que realmente é. Travou-se uma discussão – inútil – se Dourado era ou não homofóbico. A defesa – que contou com muito dos chamados simpatizantes – colocou que era uma alegação sem fundamento acusar o lutador de não gostar dos gays e que isso não valeria para sua eliminação no programa. O que podemos claramente ler como pensamentos distorcidos perversamente e vazios de lógica já que para as bichas militantes, passando pelas clubbers, qua quás, e uma infinidade de tribos homossexuais não há dúvidas sobre a homofobia do brother. E me desculpem, nesse quesito, nós bees – e ainda numa diversidade tão grande –, sabemos muito bem identificar um homofóbico.

Mas isso pouco importa, mais revelador foi Dourado falar palavras de ordem depois de sua permanência na casa: Força e honra! Fechando ali, no pequeno mundo da tv que espelha o Brasil, a representação de um pensamento totalitário, feito de palavras vazias para esconder outra ação, a da intolerância. É nisso que temos que ficar atentos. O resto são apenas 1 milhão e meio de reais que não nos pertence.

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 24/01/2010

Tá bafo esse BBB que muitos já chamam de GLBBBT. Confesso que o nome “coloridos” dado pela produção do reality à turma assumida do babado me deu um pouco de arrepio, pois esse nome sempre me vem à mente associado com o ex-presidente Fernando Collor de Mello, que é bem mais representativo no corpo – sarado – e na mentalidade de Marcelo Dourado, forte candidato para representar o homofóbico da casa.

Mas o que é interessante ver nas personas dos chamados coloridos da casa: Dicesar, mais conhecido como a drag Dimmy Kieer, Sérgio, a neo-gótica-emo Sr. Orgastic e Angélica é que eles não fazem nem representam o tal “gay família”, termo para as bees e lelés muito comportadas e que tentam se enquadrar na normatividade hétero. Eles são histriônicos e fechativos como muitos de nós somos. Com muito barulho, eles mostram também uma de nossas caras, um jeito de ser que deve ser respeitado por mais que isso incomode muitos gays (homofóbicos) que reprovam esse tipo de comportamento.

Por outro lado, foi de maneira silenciosa e ética que a Folha noticiou, na semana passada, a união homoafetica do estilista Alexandre Herchcovitch em um cartório. Não foi destaque, nem manchete, era apenas um parágrafo que noticiava uma relação como outra qualquer da mesma maneira que um jornalismo sério noticia um casamento entre um homem e uma mulher. Nesse caso ser normativo é um avanço, é tratar em pé de igualdade – em certas questões – tantos os homossexuais como os héteros.

Em ambos os casos, seja no barulho da fechação, seja no respeito ao espaço privado, os homossexuais mostram que são diversos, mas estão no mesmo reality quando a palavra é respeito ou falta de.

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 10/01/2010

Dias desses, perto da virada do ano, uma bee me falou de maneira nada modesta a seguinte frase: “Eu não sou preconceituoso com nada”. Eu, que já estava da pá virada, respondi sem pensar: “Pois eu tenho inúmeros, a começar por essa frase que me disse. Aliás, eu não confio em ninguém que não tenha preconceitos”. Apesar da aparente agressividade, o que quis dizer era que está no cerne dos seres humanos ter valores pré-concebidos – quase sempre de forma frívola e superficial – sobre as coisas e as pessoas.

Algumas vezes está no preconceito um sentido de auto preservação muito ligado à prudência. Outras vezes, ele age como uma senha para você poder participar ou ser aceito por algum grupo, família ou nação. Sem falar que de algum forma, serve para nos guiar e dar juizo de gostos e valores principalmente nessa linha tênue que separa o preconceito do gosto pessoal.

Toda essa relação acima é só para mostrar como o preconceito é muito mais inerente ao ser do que imaginamos, mas isso não significa que ele é cheio de positividade, muito pelo contrário, de fundo ele traz sectarismos, intolerância e violência.

Faz parte de todo o processo civilizatório atenuar e explicitar o preconceito. Como uma doença incurável, o Ocidente, ao longo dos séculos e mais precisamente nesses últimos tempos, tenta domar a fúria que o preconceito produz, amenizando seus efeitos. Para isso, como no caso dos tratamentos de dependentes químicos e do álcool, para que realmente o tratamento tenha efeito é necessário primeiro assumir os preconceitos que possuímos e não pavonearmos que nunca tivemos tais sentimentos. Deixando assim de fingir sermos moderninhos, como aqueles que adoram dizer que fumaram mas não tragaram.

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 13/12/2009

Você sabe que é gay. Talvez experimentou relações com meninas, mas sentiu que algo mais forte te levava a querer brincar com os meninos. O que te incomoda nem são as conversas de vestuário sobre a gostosa da classe ou a saída com outros garotos pra fazer a “zoação” com as garotas que praticam a profissão mais antiga do mundo. Ancestral mesmo é sua vontade de ser o que realmente é e ter que dissimular sentimentos como falar mecanicamente que aquela “mina é da hora”. Olha para a bichinha da escola e sente que ela, apesar das possíveis humilhações, é mais feliz e autêntica que você. Nesse momento, tem certeza que, apesar da ideia de inferioridade que fazem das quá quás, ela está em posição superior a sua. Todos não tem dúvidas sobre ela enquanto você é um poço de interrogações para si mesmo.
Em casa, seu pai, meio de sacanagem, quer saber se você é o garanhão da escola e sua mãe, religiosa, adoraria te ver no altar casando com toda a pompa. São eles que pressionam, para o bem ou para o mal, pelas suas respostas. Como um Cristo ou um Diabo perante a cruz, não há muita saída, você não os quer decepcionar mas também não quer se torturar. Como se livrar dessa angústia? Alguns infelizmente não aguentam e respondem da forma mais triste: o suicídio, se recusando à verdade e à vida. Mas outros preferem apenas sair de casa, se afastar da família, viver feliz sua sexualidade longe daqueles que preferem a mentira. E há ainda outros que respondem saindo do armário e acabando com toda essa encenação de uma vez por todas. Em todos os casos, muito antes de suas respostas, já houve a decisão dos pais, que – posso estar enganado – sempre souberam que você é gay.

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 29/11/2009

Primeiro veio um e-mail de um amigo, depois de outro, até a escritora Clarah Averbuck que, a princípio tem muito pouco a ver com tudo isso, escreveu em sua página no Facebook: “Bom, eu não costumo passar essas coisas, mas essa é importante”. Ela se refere, como da maior importância, a mobilização, de forma viral, de boa parte progressista da sociedade contra um futuro resultado, que mesmo simbólico, pode abrir precedentes ruins para o futuro dos homossexuais no país.
Durante todo o mês de novembro, o site do Senado (www.senado.gov.br/agenda/) colocou na sua home uma enquete sobre o PLC 122/2006 que torna crime o preconceito contra os homossexuais. Até o dia 26, o resultado estava sugerindo empate com 51% a favor do projeto de lei contra 49% que adoram chamar a proposta de “ditadura dos gays” invertendo os conceitos e camuflando a intolerância por um manto religioso. Mais de 290 mil votos foram computados até então e a votação se encerra no dia 30 desse mês.
Vale lembrar que mesmo com toda essa mobilização, a vantagem esteve quase sempre do lado dos que acham um absurdo não poderem “ensinar para seus filhos que a homossexualidade é pecado, por medo de irem para a prisão”. Mais uma inversão perversa em um país que tem um alto índice de gays assassinados por sua opção sexual.
Questiono inquieto sobre as milhões de bees e simpatizantes que fervem nas passeatas gays do Rio e São Paulo, onde foram parar nesse momento? E porque certas igrejas falam tanto de amor, mas na prática defendem o ódio e a intolerância?
Sim, é uma pequena batalha, não só dos gays, mas de todos que querem ver nossa sociedade avançar de forma verdadeira.


Crivella: contra a tal “ditadura gay” e levando a intolerância para o campo da religião

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 15/11/2009


Todos já sabem da saia justa que aconteceu na Uniban quando a estudante de Turismo, Geisy Vila Nova Arruda, 20, no dia 22 de outubro, foi agredida verbalmente, acuada, xingada e ameaçada de estupro porque estava usando um mini-vestido. A primeira reação da universidade não poderia ser mais cinto de castidade, expulsou a aluna por “flagrante desrespeito aos princípios éticos, à dignidade acadêmica e à moralidade”. A mini-treva só não aumentou porque parte da sociedade progressista do país fez uma enorme pressão e a universidade teve que revogar a decisão.
Mas o que foi mais impressionante nessa discussão toda foi a reação de muitas mulheres que condenaram veemente o uso da mini-saia de Geisy, esquecendo que foi essa peça exatamente o símbolo da liberação feminina que começou nos anos 60. E se hoje elas podem frequentar uma universidade ao invés de ficar o dia inteiro no fogão, algo se deve à esse pequeno pedaço de tecido. Como bem disse uma amiga esclarecida, Malu Lopes, ao dizer que foi a aluna que causou a situação, temos o mesmo raciocínio machista que diz que mulher só é estuprada porque provoca o estuprador. Isso diz muito sobre as minorias: as mulheres continuam seus maiores algozes, assim como os gays. Veja quando um viado apanha na rua de uma gangue, as bichinhas são as primeiras a proclamar: “Com certeza devia estar mexendo com os bofes”, como se isso fosse algo profundamente condenável, se tivesse acontecido. É um triste sinal que as minorias pensando assim permanecerão servas voluntárias por muito tempo. Contra isso, viva a mini-saia de Geysi!

COLUNA DA REVISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO – 01/11/2009

O assunto que entre os gays, militantes ou não, está deixando todos de peito inflado de cólera essa semana é o depoimento do governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB). No programa “Escola de Governo”, transmitido pela TV Educativa, ele tentou brincar dizendo: “A ação do governo não é só em defesa do interesse público, é [em prol] da saúde da mulher também. Embora hoje câncer de mama seja uma doença masculina também, né? Deve ser consequência dessas passeatas gay”.
A grande parada desse comentário é reanimar a imagem dos gays como portadores e transmissores de doenças terríveis. Muita gente ainda hoje estufa o peito e diz que a culpa da Aids é dos viados. Durante anos a doença ficou conhecida como peste gay. Só o fato de ser homossexual e declarar isso em um posto de saúde te impede de doar sangue. Entendo o lado sanitarista da proibição, mas exatamente como não existe um homem igual ao outro, os gays também não nasceram em uma única forma, muitos tem relações estáveis e monogâmicas. Mesmo que na nota técnica de 2008 o Ministério da Saúde diga que “O objetivo não é a exclusão do grupo de gays […] nem tampouco apoiar atitudes de constrangimentos e de discriminação desta natureza nos serviços de hemoterapia”, acabamos sendo apunhalados no peito com o estigma de aedes aegypti dos males do mundo.
Será que o câncer de mama nos homens vem mesmo das paradas gays? Ou será que é dos políticos que não param nunca de mamar nas tetas do Estado?
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As mamas de Requião!